quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Pode-se amar a TV?


É na tentativa de não ser muito monótono para os meus colegas – porque também eu não espero encontrar aqui textos cuja única motivação para os ler venha da “obrigação” ética distribuída em aula – que deixo aqui o meu primeiro post. Não será o último, feliz ou infelizmente, mas ainda assim tentarei não assumir um dos papéis mais cinzentos que a televisão assume hoje em dia: o de “encher chouriços”, passe a expressão.

Pode-se amar a TV? Pode. É possível. E para alegar isto posso defender duas causas possíveis. Posso tentar explicar o amor, a forma como se manifesta perante gente/ coisas a que quase todo o mundo guardaria ódio; as razões que a razão desconhece. Como diz o ditado – e com muito mérito, digo – “quem feio ama, bonito lhe parece”, por isso considero aqui, em primeira instância, que sim: é possível amar qualquer um, qualquer pessoa, qualquer objecto, qualquer coisa, incluindo a televisão. A televisão existe e por isso corre o risco de ser amada, tal como todas as coisas que existem. Hoje, a televisão está presente em todas as casas, assim, o risco de ser amada aumenta colossalmente.

A segunda prende-se com as razões que podem fazer alguém amar a TV. O conceito de qualidade televisiva não é, ainda, muito importante para o consumidor de televisão. Esse critério é definido pelo gosto do consumidor, pelo gosto de cada um. Um consumidor com gostos pouco exigentes será mais fácil de agradar. Será mais fácil amarmos a televisão se formos um desses consumidores. Mas nem todos têm o mesmo acesso à televisão. A televisão por cabo só é uma realidade para uma percentagem ainda pequena da população total do país. E nem todos são consumidores fáceis de agradar, por isso, esta é uma questão delicada.

Existem então quatro variáveis, a saber:

· Se formos consumidores pouco exigentes e tivermos acesso à televisão por cabo, a probabilidade de se amar a TV é grande: temos o privilégio de assistir a inúmeros canais, com eles vêm inúmeros programas e uma diversidade inigualável. Assistimos ao programa “X” no canal “A” e quando este acaba mudamos para o canal “B” porque vai começar o programa “Y”. Ou então deixamo-nos ficar no canal “A” porque também gostamos de o programa “Z”. Assombra-nos apenas a árdua (ironicamente, claro) tarefa de escolher. Nestas circunstâncias é muito fácil amar a TV.

· Se formos consumidores muito exigentes e tivermos acesso à televisão por cabo, criamos uma inconsciente tendência para reduzir para 4 ou 5 os canais que consideramos terem alguma (não muita, porque somos muito exigentes) qualidade. Possuímos televisão por cabo, mas só usufruímos dela às vezes e apenas a um espólio de canais reduzido. Torna-se assim mais difícil amar a TV, no entanto, não é impossível, basta que esses 4 ou 5 canais que achamos terem qualidade nos surpreendam com uma programação capaz de nos agradar na maior parte das vezes.

· Se formos consumidores pouco exigentes e não tivermos acesso à televisão por cabo, ainda que a variedade e o espólio de canais seja drasticamente menor, a enorme capacidade de adaptação que o ser humano possui fará com que se tornem suficientes para o nosso lazer os canais que nos sobram. O deslumbre não é muito, mas ainda assim é possível amar a TV, haja a capacidade de a desligar nas alturas em que nada que nos agrade está no ar.

· Se formos consumidores muito exigentes e não tivermos acesso à televisão por cabo, fica praticamente comprometida a capacidade de amar a TV. O espólio de canais é reduzido assim como é a probabilidade de se encontrar algo que nos agrade neles. E isso alia-se ao facto de ser difícil agradar pessoas difíceis de agradar. Pode ser que consigamos amar um programa ou dois, mas a TV…

Concluo, até porque o tamanho deste post veio a tornar-se considerável, que as possibilidades de amar a TV são boas. Tudo depende de nós e da capacidade que temos para amá-la. O conceito de qualidade nunca será uníssono e buscará sempre os formatos mais lucrativos, como tal, resta-nos adaptar os nossos gostos àquilo que nos é dado a ver. Televisão: amá-la-emos em algumas circunstâncias, mas convém não esquecer que existem muitas outras coisas a merecer o nosso amor: livros, rádio, internet ou até gente.

4 comentários:

Obi disse...

A televisão, apesar de ser bastante contrariado, já faz parte da nossa cultura. As pessoas chegam a casa e uma das primeiras coisas que fazem é ligar a televisão.

Não acredito que seja amor, mas sim, por gosto. Uma pessoa não sofre de amores por uma televisão ou pelos seus programas. Apenas gosta do que vê e segue o ser percurso.

As audiências não querem saber da qualidade, mas sim da quantidade, por isso não lhes interessa se as pessoas vêm o noticiário ou os "reality shows".

Eu vejo bastante televisão e não é por isso que a amo. Gosto de ver televisão como gosto de ler um livro ou navegar na internet. É um objecto. E não se pode amar objectos. Podemos gostar bastante deles, mas nunca chamar a isso amor...

Anónimo disse...

Esse "gosto" que tens pela televisão é gosto suficiente para que o inconsciente (ou o sub-consciente, ou seja lá qual for a parte do nosso cérebro responsável por isto) o veja como amor.

O amor é muito relativo, e eu acredito que podemos amar objectos ou coisas, lá está, muitas vezes sem saber que o amamos pois a parte do nosso cérebro que julga o que é o amor e que cria limites e barreiras a ele não é a mesma que ama.

No Dicionário Moderno da Língua Portuguesa, editado pelo Círculo de Leitores, que aqui tenho, diz que amor é o «sentimento que nos impele para o objecto dos nossos desejos», ora, se inconscientemente sentes uma impulsão para ver televisão, constantemente, pode-se chamar a isso amor.

Gabriela Borges disse...

Pela imagem podemos inferir que com certeza o Homer ama a televisão...
Acho que a pergunta provocativa do texto está relacionada com o facto de que, no fundo, todos nós temos uma relação bastante próxima da televisão e muitas vezes não assumimos este nosso "amor", seja por vergonha, elitismo ou até mesmo para não dar o braço a torcer.
No entanto, se a televisão apresentasse melhores programas, mais interessantes e mais inteligentes, talvez não tivéssemos problema em assumir que amamos aquilo que ela exibe.

Mimi disse...

Eu acho que se pode amar a televisão, mas acho que é para muitas pessoas dificil de admiti-lo, mas acho que se deve por causa do uso deste sentimento tão forte, AMAR. Asusta logo as pessoas.
Se fizessemos um inquérito a perguntar,amas a televisão ou és fanático pela televisão, provavelmente iriamos ter respostas diferentes.
Concordo com o Dário, do ponto de vista que ele tem em relação ao amor, há diferentes maneiras de amar e pode-se amar objectos.
Mas se nos sentimos felizes, entusiasmados a ver os programas que gostamos, é porque amamos a TV.